sexta-feira, 1 de julho de 2011

Banda: Giant Squid; Álbum: The Ichthyologist

Banda: Giant Squid
Álbum: The Ichthyologist
Ano: 2009
Gênero:
Post-Metal; Doom Metal

É o terceiro álbum "metal" que eu resenho em seguida, mas não é à toa. Aqueles que dizem que o metal está morto ou que as bandas novas não prestam deveriam buscar conhecer as bandas certas - ou deixar de se prender apenas às clássicas, logicamente.


O Giant Squid é uma banda estadunidense formada em 2001. Como muitas bandas, eles não deram muita sorte e fizeram muito, mas muito de seu trabalho na unha. Um exemplo disso é o trabalho de gravar, empacotar e lançar 400 cópias de seu EP Monster Of The Creek à mão em 2004. As músicas deste EP conceitual falavam sobre os ataques de tubarões de 1916 nos EUA, que foram muito famosos e entraram para a cultura popular estadunidense, influenciando Peter Benchley a escrever o romance Tubarão em 1974 e, consequentemente, Steven Spielberg a gravar o clássico filme baseado no livro em 1975.

O destino finalmente sorriu para o Giant Squid, e o EP caiu nas mãos dos empregados da gravadora The End Records, que tem em sua lista de assinados nomes como Danzig, Helloween, Tarja Turunen e os já resenhados Sleepytime Gorilla Museum. Isso permitiu a eles gravar profissionalmente seu primeiro álbum, Metridium Fields, em 2006. O álbum já havia sido gravado em 2004, mas independentemente e sem muitos recursos. Isso levou a banda a regravá-lo na íntegra.

A recepção do debut do Giant Squid foi ótima e a banda fez uma turnê bem sucedida nos EUA para divulgar o álbum. De fato, a turnê foi tão bem sucedida que a gravadora queria prolongá-la ainda mais, e a banda, ansiosa por gravar um novo álbum, voltou a ser independente.

Isso não os desanimou. Pelo contrário: os já experientes membros da banda se sentiam preparados e seguros para fazer um novo álbum, e então começou o nascimento de The Ichthyologist.

A formação do Giant Squid sempre mudou muito - motivo pelo qual eu não a havia comentado até então. A banda coleciona 10 ex-integrantes, mas a formação que gravou The Ichthyologist permanece quase a mesma desde 2009: Aaron Gregory (guitarra/vocal), Bryan Beeson (baixo), Chris Lyman (bateria)  e Jackie Perez Gratz (violoncelo/vocal). Lyman seria substituído por Scott Sutton posteriormente.

O álbum foi gravado em 2008 e lançado em fevereiro de 2009. As primeiras 50 cópias, disponíveis para pré-venda, vinham com um dente de tubarão que o Aaron havia coletado em um aquário de São Francisco (onde, diga-se de passagem, ele trabalha como mergulhador, cuidando dos animais). Isso porque The Ichthyologist, a exemplo do EP debut, também é conceitual. Fala sobre um homem que foi separado de sua própria humanidade ao se perder no mar com seu navio e, durante seus vários anos vagando no mar, adota maneiras não humanas de sobrevivência para, no final, se tornar um outro tipo de ser. As músicas têm um nome original e um nome em latim, que corresponde à nomenclatura científica de algo relacionado ao mar.

A faixa de abertura é Panthalassa (Lampetra tridentata), e a partir dela já dá pra ter uma noção do que o Giant Squid é capaz. Em um compasso 6/4, a guitarra limpa de Gregory e o violoncelo de Gratz preparam o ouvinte para todo o peso que vem depois, em um riff pesado e coeso. A voz de Gregory agrada tanto quanto sua interpretação, mas o que eu destacaria mais neste disco não seria a habilidade ou o virtuosismo dos músicos, mas todas as texturas das músicas. Tudo parece ter sido muito bem pensado, muito bem analisado. Tanto o trompete que surge surpreendentemente quanto o baixo com distorção, o que mostra, ao mesmo tempo, influências muito distintas. Quando os vocais de Gratz entram e adicionam o lírico feminino, bem no final, não restam dúvidas sobre o talento incrível da banda.


La Brea Tar Pits (Pseudomonas putida) é lenta, tem um ritmo arrastado, alternando tônicas e quintas e com um vocal incrivelmente sofrido. A partir dos dois minutos, a música fica bem mais limpa e os fraseados de guitarras ficam mais delicados, mas nem por isso menos tensa. No final, um solo de guitarra, mas neste disco eles são raros e muito diferentes dos solos das maiorias das bandas de metal - não há virtuosismo: a banda sempre preza pelo feeling e pela textura. Pesadíssima e belíssima.

Sutterville (Vibrio cholerae) é uma das mais estranhas do álbum (e uma de minhas favoritas). Tudo nela é estranho: tanto o compasso irregular quanto a melodia meio letárgica, meio onírica. O vocal preguiçoso passa a impressão de uma resignação obrigatória. As guitarras parecem violinos misturados ao violoncelo de Gratz. Ótima faixa.


Dead Man Slough (Pacifastacus leniusculus), a exemplo de La Brea Tar Pits, tem um ritmo lento, mas aqui o violoncelo tem um papel mais proeminente. A música tem um clima mais ameno, apesar do vocal quase sussurrado de Gregory. As intervenções vocais de Gratz são um belo toque. Destaque para a passagem calmíssima cantada pela moça e pelo final pesadíssimo.

Throwing A Donner Party At Sea (Physeter catodon) é uma paulada. Começa com um riff distorcido e logo a banda toda entra como um trovão. A faixa tem características que lembram desde System Of A Down até death metal, com participação especial de Karyn Crisis (do Crisis
) no vocal. A parte instrumental é grandiosa, aproximando-se do metal sinfônico. Outro ponto altíssimo do álbum.

Sevengill (Notorynchus cepedianus - o tubarão cujos dentes foram dados nas primeiras cópias) começa com um apito de navio ao fundo e se transforma em uma bela balada, novamente com os vocais de Gregory carregados com o sofrimento do protagonista do álbum. Esta faixa conta com a colaboração de
 Anneke Van Giersbergen (do The Gathering) nos vocais e Lorraine Rath (Amber Asylum) na flauta. No final a música ganha todo um peso dramático. Não é das minhas favoritas, mas não deixa de ser uma boa faixa.

Mormon Island (Alluvial Au) poderia facilmente ser a trilha sonora de um filme de terror. Os violinos da convidada Kris Force (Amber Asylum) junto com a guitarra minimalista e o cello de Gratz
 criam um suspense incrível, uma calmaria desesperadora que parece estar sempre à beira de uma perturbação súbita. É praticamente um ambient de terror. Bela faixa.

Blue Linckia (Linckia laevigataalterna momentos pesados em compassos irregulares e tom medievalesco com momentos mais líricos e melódicos levados pelo cello de Gratz
. É uma faixa grandiosa, novamente muito bem texturizada. O riff do final se extende por três minutos, variando apenas na intensidade e roupagem.

Emerald Bay (Prionace glauca) é uma faixa calma e extremamente minimalusta, guiada basicamente pela guitarra limpa e pelos vocais. Conta com a participação de Cat Gratz, irma da violoncelista Jackie
. A faixa não decola, mas contribui muito com a integridade do álbum.

Rubicon Wall (Acipenser transmontanus) é o gran finale e cumpre com a responsabilidade. A bateria de Lyman é um destaque, e a banda toda faz um belo papel em todas as variações da música: do início melódico e triste ao peso dramático que se segue, com as guitarras distorcidas e o vocal de Gregory. É extremamente pesada e lenta (resquício da grande influência de doom metal
) e tem diversas mudanças de andamento. As melodias são belíssimas, e certamente é um ótimo jeito de encerrar este belo álbum.

Rótulos à parte, este álbum do Giant Squid
 é uma ótima opção para quem procura criatividade e beleza dentro de um gênero tão estereotipado quanto o metal. Instrumentos inusitados e arranjos belíssimos aliados a peso e groove.

Recomendadíssimo para fãs de metal, de música criativa e oceanógrafos.

Tracklist:
  1. Panthalassa (Lampetra tridentata) – 5:50
  2. La Brea Tar Pits (Pseudomonas putida) – 7:28
  3. Sutterville (Vibrio cholerae) – 4:08
  4. Dead Man Slough (Pacifastacus leniusculus) – 5:33
  5. Throwing a Donner Party at Sea (Physeter catodon) ft. Karyn Crisis – 5:40
  6. Sevengill (Notorynchus cepedianus) ft. Anneke van GiersbergenLorraine Rath – 7:10
  7. Mormon Island (Alluvial Au) ft. Kris Force – 6:39
  8. Blue Linckia (Linckia laevigata) – 7:13
  9. Emerald Bay (Prionace glauca) ft. Cat Gratz – 6:11
  10. Rubicon Wall (Acipenser transmontanus) – 7:59